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há o perigo de um grito lindíssimo

quando andas assim comigo no invisível




Mário Cesariny

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domingo, 26 de fevereiro de 2017



todos os cães mudos de luz à passagem do cortejo
o sorriso do homem do trombone de varas
pendurado no rebate dos sinos
cai uma chuva miudinha a amortalhar o som dos metais
a tenda das comédias ensopa debo-
tada de uma alegria de domingo
vêm as crianças pedir as janeiras à nossa porta
cantam na sua inocência de quem não
sabe da lama nos nossos pés
e afagam-nos com cantigas de cristal para
nos limpar da tristeza pressentida
enfim a tarde vai chegando muito cedo e olha-
mos as janelas iluminadas das casas
que são dos outros,
como quem passeia um cão na noite da consoada


Alexandre Sarrazola
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segunda-feira, 28 de março de 2016



arrancaram-nos o baloiço do jardim;
se calhar já estamos crescidos
o espelho pende como um rosto do bico da pega
aquela que sujava o chão da cozinha,
picava as pernas das raparigas e roubava anéis de ouro nos dias de chuva

a pega morreu há muitos anos, nunca a conhecemos.
só lá está o terraço e uma videira muito velhinha.
não sei porque nos arrancaram o baloiço do jardim,
agora que passaram os Santos e o Natal se aproxima

o outro lado do espelho fala de dois miúdos a espreitar;
os olhos redondos a conquistar os leões entre a música de circo
tudo vemelho amarelo e azul com serpentinas e o calor do riso dos pais.
do lado de cá já se envergam chapeuzinhos de tédio com véus
de pés-de-galinha´

a esperança nos faróis dos carros às cinco da tarde, já noite pelo inverno
e o pai que se atrasava a ir buscar-nos à catequese ou à ginástica.
“ainda não é aquele, que o wolkswagen tem uns faróis redondinhos”
como os nossos olhos sem expressão a fitar os buracos que restam na terra
do jardim.
não sei porque nos arrancaram o baloiço


Alexandre Sarrazola
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